Correlacionar e atribuir significado Reflexões sobre o humano
Publicado em 02/04/2016 por Gustavo Dutra
O ser humano tem duas características que o ajudaram a evoluir até onde estamos: a de fazer correlações e a de atribuir significados. No primeiro caso, as correlações permitiram assimilar conhecimentos de forma mais rápida, pois permitiu as metáforas, o que melhorou a comunicação. Já a segunda característica motivou o avanço, seja para construir uma cidade, seja para louvar um deus ou provar uma teoria pelo bem da verdade.
Nosso cérebro está fazendo correlações e procurando significado o tempo todo!
Reflexos na arte
A maioria das pessoas irão atribuir ao artista do quadro mais realista, pintado com a maior verossimilidade, maior valor artístico que um quadro abstrato.
Isso dá-se porque um quadro cuja representatividade é quase de uma foto exige pouco poder de correlação, permitindo, assim, pouco esforço no exercício de atribuição de significado.
Já no quadro abstrato é necessário observar seus nuances, suas pinceladas, a mescla de cores e mais uma quantidade enorme de fatores, tornando a correlação bem custosa e minguando a possiblidade do encontro do significado.
Ora, “o que vejo nesse quadro?”, pode pensar aquele que se depara com arte abstrata. Como exige mais percepção, perceber seus sentimentos, as sensações que passam, este indivíduo acaba não encontrando significado. “Isso eu também faria”, diria, colocando, assim, a arte abstrata como uma produção menos artística que a anterior.
Na literatura, o mesmo ocorre. A poesia talvez seja uma espécie de arte abstrata da literatura, onde a correlação é custosa devido a sua própria natureza. Porém, a dificuldade de assimilação também dificulta a significação de prosa.
Poderia comparar Paulo Coelho com James Joyce ou J. K. Rowling com a trilogia do pós guerra de Beckett, daria no mesmo. O último sempre teria maior dificuldade de empatia, distanciando leitor e obra por falta de significação.
Nas esculturas, pode-se utilizar os exemplos das bienais, cheias de construções que para muitos não fazem sentido. Tenho certeza, é apenas uma dificuldade em criar correlações nessa área.
Aquilo que não for possível atribuir significado não será bem visto aos olhos humanos.
Como lidar com isto
Bom, a autopercepção dos próprios sentimentos e atos é a primeira coisa necessária para se compreender e evoluir. Com essa percepção, ao se deparar em situações onde ocorra, de alguma forma, algum julgamento, seja visitando museus, seja lendo um livro, seja assistindo um filme, é necessário esforçar-se para encontrar o sentido.
Encontrar o sentido pode ser um pouco confuso e talvez exija, conhecimentos e informações adquiridas previamente. Nesse caso, estamos fadados a não gostar de algo de imediato e reconsiderar mais à frente, se algum dia esse conhecimento e informação chegarem. Logo,
É necessário reconsiderar as obras de tempos em tempos, pois as correlações irão mudar: pode-se amar mais uma obra, odiá-la menos ou deixá-la na insignificância.
Isso me lembrou muito aquela coisa já batida que gira em torno dos colecionadores. Nenhum colecionador compra um item pelo item em si, mas pela sua história: porque pertenceu a alguém importante, porque foram fabricados poucos exemplares, etc.
Para se reconhecer o valor na peça, é necessário conhecer sua história.